sexta-feira, 29 de maio de 2015

Para auxiliar crianças

Para auxiliar crianças
 - Fotógrafo: Jornal da Gente
A violência, cada vez mais exposta pela mídia, tem preocupado pais, educadores e pesquisadores. Acredita-se que a mídia em geral pode influenciar o comportamento da criança e do adolescente, fazendo com que sejam mais agressivos ou encarem a violência como algo banal. Por outro lado, muitos dizem não ser possível responsabilizar os meios de comunicação pelo aumento da violência entre as crianças, mas sim pela violência praticada contra a infância, contra os seus direitos como criança e ser humano. Pesquisas mostram que, atualmente, a tevê é a principal fonte de informação na maioria dos lares. A programação muitas vezes passa a ser modelo para muitas famílias. Muitos momentos entre pais e filhos que deveriam ser mais bem aproveitados, como a conversa na hora do jantar, são substituídos pela televisão, onde muitos passam horas e horas, inertes. Segundo a psicopedagoga Maria Tereza Pereira de Almeida, “as crianças ficam cada vez mais tempo em frente à tevê, até mesmo na companhia dos pais, que apenas assistem aos programas sem se preocuparem com o conteúdo”. Para ela, as crianças e adolescentes são mais vulneráveis aos apelos televisivos do que os adultos, sendo também mais facilmente impressionáveis. “Sua personalidade ainda está em formação e as informações que recebe são entendidas de acordo com o universo psíquico da criança, incluindo o ambiente em que vive. E estas influências podem estabelecer padrões de comportamento agressivo ou não”. Nesta entrevista, Maria Tereza fala da importância do papel da família e da escola na formação da criança, além dos problemas gerados pelo estresse e pela violência. A psicopedagoga é pós-graduada pelo Mackenzie, atende crianças com dificuldades de aprendizagem, além de ser contadora de histórias e bonequeira. A criança de hoje não brinca mais, passando muitas vezes mais horas em frente ao computador e à televisão. Ela está cada vez mais se comportando como um adulto? Sim. A cobrança de que ela se comporte como um adulto é muito grande, mesmo nas escolas. A família mesmo já não está com tanto tempo para a criança. Pais muito estressados acabam passando isso para os filhos. As brigas dentro de casa, enfim, é preciso pensar que as crianças são atingidas não só pela violência que vem da televisão e da internet. Os pais não podem abandonar a formação da criança. E as escolas também não. Aliás, a escola poderia ajudar a amenizar esta situação, ajudando na avaliação do conteúdo da tevê, auxiliando a criança a fazer escolhas melhores dentro da programação, bem como para ter uma visão crítica daquilo que assiste. Trabalho com oficinas interativas que ajudam a desviar o foco que as crianças estão tendo em violência de todo tipo, do que está passando na televisão e do que elas vêem na internet. Nessas oficinas trabalho a parte de leitura, criação de bonecos e fantoches, dramatização, contação de histórias. Tudo que explore a criatividade. A formação da criança vem de dentro para fora de casa. Isso se dá mesmo com tantas mudanças na estrutura familiar? Deveria. As agressões dentro da família acontecem de diversas maneiras. As crianças estão captando tudo que os casais falam. Principalmente na primeira fase da infância, até os seis anos. É preciso tomar muito cuidado. As brigas na família podem causar a queda do rendimento escolar. A criança se torna deprimida e ansiosa. Existe ainda a negligência familiar, os maus tratos, o abandono por parte do pai, a falta de apoio social, bairros perigosos... O que elas captam se reflete na adolescência, por exemplo. Basta ver como os adolescentes estão hoje; eles têm uma série de problemas. E a família, às vezes, acaba deixando a educação da criança por conta da escola. Tudo é a escola e a criança tem uma série de atividades além da escola. A escola faz o trabalho dela, mas e em casa? E os valores passados pela família? Há criança que tem a agenda cheia, mas como os pais dão atenção a ela, a criança não tem problemas. Leva tudo muito bem e não sofre de estresse, depressão. A maneira como a educação da criança é conduzida é que faz a diferença.Existe a maneira ideal para educar uma criança? É preciso que os pais estejam muito presentes na vida dos filhos e que passem valores para eles. A escola também pode ajudar na formação desses valores. Eles precisam ajuda-la na hora de escolher os programas de televisão que irão assistir, orientando sobre qual o melhor caminho. As brincadeiras educativas ajudam a criança a trabalhar de acordo com o mundo psíquico dela. Por exemplo, o menino de rua não tem acesso à televisão e tem como referência a situação que ele vivencia, que é a da rua, com toda a violência que existe. Ou seja, não se pode dizer que ele seja influenciado pela televisão. Por isso não se pode alegar que tudo é por causa da tevê, tudo é por causa da internet. Vai depender, em parte, da situação de vida de cada um. A sociedade está com problemas em suas bases e uma dessas bases é a família. Não se pode dizer que a mídia é a única culpada. E de que maneira a violência e o medo que ela gera, a maneira como os pais têm lidado com os filhos, o excesso de liberdade e ao mesmo tempo de proteção, mexem com a cabeça das crianças? Muitas crianças hoje, por conta destes problemas, sofrem de depressão e síndrome do pânico, por exemplo. Em alguns casos mais graves, elas precisam até tomar remédios fortes. Há também crianças hiperativas, agressivas, com insônia, outras têm pesadelos. Tudo isso é muito grave na infância e a maior parte é gerada pelo estresse. Se os pais não se trabalharem também, acabam passando isso para a criança. O estresse acaba inibindo a criatividade natural da infância. E é a criatividade que ajuda a tornar o indivíduo mais seguro. As crianças hoje têm muitos problemas de saúde que são de adultos. Muito disso porque a criatividade e as brincadeiras, que são fundamentais, acabam sendo inibidas. A terapia ajuda a tratar da pessoa nestes casos? Sim, mas o papel dos pais é fundamental. Eles devem fazer programas saudáveis com as crianças; têm tanta coisa boa na cidade, como os parques, as unidades do Sesc. Não precisa deixar a criança o dia todo em frente à televisão. Às vezes, os próprios pais estão assistindo à tevê e não estão nem aí para o que a criança está vendo, para o tipo de programa e se ele vai influenciar a criança. Que valores estão sendo deixados de lado? O que mais se observa nas crianças é a falta de solidariedade. Muitas delas não têm valores morais e éticos de compreensão, de ajudar o amigo. Vemos coisas gravíssimas, principalmente entre os adolescentes. Como exemplo, o bulling (gozação, agressão, ofensa, humilhação). Isso é muito grave! E a criança vítima de perseguição dos colegas nem sempre conta para os pais ou professores por medo, vergonha... O que está acontecendo com as crianças e adolescentes é um reflexo de toda a situação em que nos encontramos, como falta de educação de qualidade, abandono, falta de atendimento em saúde de qualidade, tudo isso afeta as crianças. Se as crianças da classe média estão sofrendo com isso, imagina as outras? Os valores estão trocados, não se conversa mais, não se entra num acordo. Você cita a criança de classe média. Quer dizer que a criança de periferia, que está mais exposta à violência, pode ser mais influenciada, por exemplo, achando que quem está certo, quem se dá bem, é o bandido, o traficante? Depende. Se ela tem uma boa estrutura familiar, vai ter valores e parâmetros, e não vai ser influenciada pelo que é ruim. Tem tantos projetos educativos voltados para essas crianças que têm dado certo. É preciso trabalhar a auto-estima delas e dar oportunidade a essas crianças de ver uma outra realidade.
Dra. Maria Tereza Pereira de Almeida 
Fonte : Daqui Perdizes Pompeia - Edição 107 - Setembro/2006
Autor : Jornal da Gente
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